Ceará Acontece: Servidor recebe de boa-fé valores pagos indevidamente pela própria Administração Pública: ele tem o dever de restituir a quantia?

terça-feira, 14 de agosto de 2018

Servidor recebe de boa-fé valores pagos indevidamente pela própria Administração Pública: ele tem o dever de restituir a quantia?


Valor indevido recebido pelo servidor público e o dever de devolução

Embora não seja um fato comum, é possível que, por algum motivo ou outro, a Administração Pública acabe creditando um valor a mais na conta bancária de algum servidor público. E, quando isso ocorre, até pode acontecer de o próprio servidor público ter conhecimento de que o crédito recebido é, de fato, maior do que o devido; porém, por outro lado, também será possível que o servidor público nem tenha ciência do valor indevido. Muitos empregados, tanto da iniciativa privada ou pública não reserva tempo para analisar contra cheque, extrato bancário, descontos como INSS, contribuição sindical, dentre outras. Por outro lado, existem servidores que não dão chance para equívocos e analisam minuciosamente.

Considerando o entendimento do STJ conclui-se que:

I- se o servidor público estiver de boa-fé, a qual é presumida, ele não é obrigado a restituir a quantia indevida à Administração Pública, por força do princípio da boa-fé objetiva (legítima confiança ou justificada expectativa);

II- mas se estiver comprovada a má-fé do servidor público, este é obrigado a devolver o quantum indevido à Administração Pública, em razão de disposição legal expressa (art. 46 da Lei n.º 8.112/90), além da vedação ao enriquecimento ilícito e do poder-dever de autotutela.

Posição do STJ

O STJ possui entendimento pacífico no sentido de que é incabível a restituição ao erário dos valores recebidos de boa-fé pelo servidor público em decorrência de errônea ou inadequada interpretação da lei por parte da Administração Pública.

Em virtude do princípio da legítima confiança, o servidor público, em regra, tem a justa expectativa de que são legais os valores pagos pela Administração Pública, porque jungida à legalidade estrita.

Assim, diante da ausência da comprovação da má-fé no recebimento dos valores pagos indevidamente por erro de direito da Administração, não se pode efetuar qualquer desconto na remuneração do servidor público a título de reposição ao erário.

Recebimento de valores indevidos em decorrência de erro operacional

No exemplo acima, o servidor recebeu os valores indevidamente por causa de erro da Administração na interpretação da lei. Vale ressaltar, no entanto, que, segundo a posição majoritária no STJ, este mesmo entendimento deve ser aplicado nos casos em que o servidor recebe as quantias indevidas por força de erro operacional da Administração. Confira:

(...) 1.   A Primeira Seção do STJ, no julgamento do Recurso Especial Representativo da Controvérsia 1.244.182/PB, firmou o entendimento de que não é devida a restituição de valores pagos a servidor público de boa-fé, por força de interpretação errônea ou má aplicação da lei por parte da Administração.

2.   O mesmo entendimento tem sido aplicado por esta Corte nos casos de mero equívoco operacional da Administração Pública, como na hipótese dos autos. Precedentes.

3.   O requisito estabelecido para a não devolução de valores pecuniários indevidamente pagos é a boa-fé do servidor que, ao recebê-los na aparência de serem corretos, firma compromissos com respaldo na pecúnia (...)

STJ. 1ª Turma. AgRg no REsp 1447354/PE, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 16/09/2014.

(...) Esta  Corte  firmou  entendimento  no  sentido  de  não ser devida a devolução  de  verba paga indevidamente a servidor em decorrência de erro  operacional da Administração Pública, quando se constata que o recebimento  pelo  beneficiado  se  deu  de  boa-fé, como no caso em análise. (...)

STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1560973/RN, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 05/04/2016.

Em suma: valores recebidos pelo servidor em decorrência de errônea interpretação da lei e em virtude de erro operacional estão sujeitos ao mesmo tratamento. Assim, houve boa-fé do servidor, não se restitui; não houve boa-fé, deve-se restituir.

Servidor não precisa devolver valor indevido que ele recebeu de boa-fé

A Administração não pode descontar na folha de pagamentos de servidor dinheiro que ele recebeu, de boa-fé, junto com o salário, mesmo que esse valor seja indevido ou tenha sido pago a mais por erro da Administração.

Com essa fundamentação, a 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região confirmou sentença de primeiro grau que, nos autos de mandado de segurança impetrado por um servidor público federal, determinou à União que não efetivasse quaisquer descontos na sua folha de pagamento de valores que lhe teriam sido pagos indevidamente.

Em suas alegações recursais, a União sustentou que a Lei 8.112/90 autoriza expressamente o desconto de valores recebidos indevidamente por servidor público, e que o recebimento indevido da Gratificação de Desempenho da Atividade Jurídica “é hipótese que autoriza a dúvida sobre a boa-fé dos servidores”. Afirmou que ao fazer os descontos do servidor “apenas cumpriu estritamente o que consta em lei, objetivando a reposição ao erário para sanar o locupletamento ilícito”.

Ao analisar o caso, o relator, desembargador federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira, citou jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que “a interpretação errônea da Administração que resulte em pagamento indevido ao servidor acaba por criar-lhe uma falsa expectativa de que os valores por ele recebidos são legais e definitivos, daí não ser devido qualquer ressarcimento”.

O relator também destacou que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Mandado de Segurança 256.641/DF, entendeu ser insuscetível de devolução a percepção de vantagem indevidamente paga pela Administração ao servidor quando houver: “presença de boa-fé do servidor; ausência, por parte do servidor, de influência ou interferência para a concessão da vantagem impugnada; existência de dúvida plausível sobre a interpretação, validade ou incidência, no momento da edição do ato que autorizou o pagamento da vantagem impugnada; interpretação razoável, embora errônea, da lei pela Administração”. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRF-1.

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Processo 39410-70.2009.4.01.3400/DF





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