Proposta de Emenda à Constituição, o texto precisa ser votado em dois turnos na Câmara, aprovado por três quintos dos deputados |
Encampada pelo governo Lula e
apressada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a reforma tributária
pode ser votada pelos deputados até o fim desta semana. Uma mudança no sistema
tributário do País é esperada há décadas.
Nessa primeira fase, a Proposta
de Emenda à Constituição (PEC) da reforma prevê apenas alterações nos tributos
que incidem sobre consumo.
Os brasileiros vão pagar mais
impostos com a reforma?
O governo diz que a reforma não
vai aumentar a carga tributária total do País. Isso significa que eventuais
aumentos em um setor serão compensados por reduções em outros.
O preço dos itens da cesta básica
vai subir?
Não é possível saber, pois as
alíquotas dos novos impostos ainda não estão definidas – isso será feito em um
momento posterior. Os itens da cesta básica, no entanto, estão na categoria de
produtos que entrarão na alíquota reduzida.
Se confirmados estudos
preliminares do Ministério da Fazenda com alíquota única de 25%, portanto, os
produtos da cesta básica seriam taxados em 12,5%.
Um levantamento feito pela
Associação Brasileira de Supermercados (Abras) aponta que, mesmo assim, a
reforma tributária pode fazer com que o imposto para produtos do setor aumente
em até 60%. O estudo foi rebatido pelo secretário extraordinário da Reforma
Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy. “Não vai acontecer”, disse Appy.
“Não tem aumento de tributação da cesta básica”, afirmou o secretário.
O coordenador de Pesquisa e
Incidência em Justiça Social e Econômica da Oxfam Brasil, Jefferson Nascimento,
defende a desoneração de 100% de, pelo menos, uma lista mais reduzida da cesta
básica, como arroz, feijão e açúcar, entre outros.
O que é o cashback? Quem vai
receber?
O cashback prevê a devolução de
parte do imposto que incide sobre o consumo. Ele será destinado para a
população de baixa renda.
O secretário extraordinário de
reforma tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, disse que ainda
discutia o desenho operacional para garantir o cashback e que o desconto
poderia ser feito “na boca do caixa”.
“Lembrando que ele pode ser um
desconto na boca do caixa. Não preciso esperar arrecadar para depois devolver.
Especialmente no Brasil é muito fácil de fazer isso”, afirmou.
Como são os impostos que pagamos
hoje para produtos como bombons? Vai mudar alguma coisa?
Atualmente, a depender do
enquadramento do produto em determinada categoria, ele pode receber um
tratamento tributário distinto ou ter uma alíquota reduzida.
É o caso do bombom sonho de
valsa, por exemplo, que foi reclassificado há um ano como “biscoito wafer” para
pagar menos impostos. Quando era classificado como chocolate, o produto pagava
3,25% de IPI. Como biscoito wafer, considerado um item de padaria, a fabricante
não precisa mais pagar IPI.
O vice-presidente Geraldo Alckmin
chegou a dizer que o Brasil tem um “manicômio tributário”. A reforma tributária
promete reduzir essas distorções.
A indústria vai pagar menos
impostos? O que isso significa?
O setor industrial deve ser o
maior beneficiado pela atual reforma, que aumenta a uniformidade das cobranças.
Atualmente, a indústria é atingida com maior intensidade pela carga tributária
– e paga cerca de 34% dos impostos federais. A indústria, portanto, deve pagar
menos impostos com a alíquota única. O governo diz que isso ajudará a gerar
empregos e reativar o setor.
É verdade que os serviços ficarão
mais caros e isso vai afetar a classe média?
A carga tributária média sobre
serviços pode subir, com a maior uniformização dos impostos. Setores
específicos, como educação, terão alíquota reduzida.
Appy disse que o setor de
serviços, de modo geral, será beneficiado com a reforma pelo crescimento
econômico e afirmou que algumas áreas do setor serão beneficiadas com redução
de carga tributária. Ele apontou que os tomadores de serviço podem ter redução
de 7% a 13% na carga pelas mudanças no sistema.
O setor defende a desoneração da
folha de pagamento como forma de compensação, para manter empregos a despeito de
aumento de custo tributário. A desoneração da folha não é discutida na etapa
atual da reforma.
Se o setor de serviços pode ter
aumento de carga tributária, gastos com educação, saúde e transporte público
vão ficar mais caros?
Não. A proposta prevê que
serviços de educação, saúde, transporte público coletivo e alguns medicamentos
estarão excluídos da regra geral de alíquota única. Nestes casos, a alíquota
cobrada será equivalente a metade (50%) da alíquota única. Também terão tarifa
reduzida produtos agropecuários in natura, atividades artísticas e produtos da
cesta básica.
Remédios vão custar mais caro?
Não. Parte dos remédios está na
previsão de alíquota reduzida (50%) e há ainda remédios, como os de tratamento
contra o câncer, que estão na terceira opção: a alíquota zero.
Voltaremos a pagar imposto na
compra de livros?
Não. Livros continuarão a ter
imunidade tributária. Conforme afirmou Appy, os planos do governo não incluem
acabar com isenção de impostos para as compras de livros no País. Atualmente, a
regra que rege a tributação de livros prevê que o bem de consumo é isento de
impostos.
Durante o governo de Jair
Bolsonaro, o então ministro da Economia Paulo Guedes sugeriu que os livros
perdessem a isenção tributária porque, segundo o chefe da pasta, os itens só
seriam consumidos “pelos ricos”. À época, o representante voltou atrás no
posicionamento diante da polêmica causada por sua declaração.
A reforma tributária pode afetar
o preço de serviços de streaming como Netflix, Disney+ e MAX?
Conforme divulgado pelo
Ministério da Fazenda, o projeto do governo pode ter impacto nos serviços de
streaming, mas essa elevação seria, segundo a pasta, compensada pela redução
sobre o preço da energia elétrica.
Como a reforma afeta os
combustíveis?
Para a Confederação Nacional dos
Transportes (CNT), uma das preocupações em relação às propostas que tramitam na
Câmara e no Senado é a possibilidade de que haja um aumento nos principais
insumos do setor, como combustíveis, energia elétrica e mão de obra. A entidade
alega que, caso aprovada, a reforma pode gerar um aumento de impostos para
esses três segmentos estratégicos para os transportes no Brasil.
Qual o impacto no
turismo/viagens?
Em um manifesto assinado
conjuntamente por diversas associações ligadas ao setor do turismo, as
entidades alegam que a aprovação da proposta de reforma tributária pode
impactar negativamente o setor, encarecendo os serviços de turismo, por
atrapalhar a competitividade do País como um destino turístico, além de
dificultar o crescimento do setor.
O crédito no Brasil pode ficar
mais caro?
Durante um evento da Federação
das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), em abril deste ano, o presidente
da Febraban, Isaac Sidney, disse que a aprovação de uma reforma tributária pode
reduzir o custo de crédito no Brasil.
O IPTU vai subir?
Não há previsão de aumento do
IPTU na reforma. No Congresso, foram incluídas seções sobre outros impostos,
além dos relativos ao consumo, como o IPTU. O que a reforma faz é autorizar que
os prefeitos atualizem a base de cálculo do imposto por meio de um decreto, ou
seja, sem a necessidade de aprovação da Câmara municipal. Isso dá mais
liberdade para os prefeitos que querem ampliar receitas mas esbarram no
legislativo local.
A inclusão deste trecho foi um
aceno feito pelo relator do texto, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-BA), aos
prefeitos, que reclamaram da reforma.
E o IPVA?
Embora a reforma seja destinada
para os tributos de consumo, essa primeira fase também prevê que itens de luxo,
como jatinhos e lanchas, sofram incidência de IPVA, assim como já ocorre com os
automóveis.
Quais tributos pagamos hoje e não
irão existir mais?
Cinco tributos que existem hoje
serão extintos. São eles: Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI),
Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para Financiamento da
Seguridade Social (Cofins), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
(ICMS) e Imposto sobre Serviços (ISS).
O que entra no lugar?
No lugar do IPI, PIS e Cofins,
que são de arrecadação do governo federal, o Brasil terá a Contribuição sobre
Bens e Serviços (CBS). A União define a alíquota neste caso.
No lugar do ICMS e do ISS, que
são arrecadados por Estados e municípios, o Brasil terá o Imposto sobre Bens e
Serviços (IBS). Os Estados e municípios definem a alíquota neste caso.
Também será criado o Imposto
Seletivo, que é federal, para onerar mais os bens e serviços que o governo quer
desestimular, por serem prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, caso de
cigarros.
Quais as características desses
novos impostos?
Além de simplificar o número de
regras existentes sobre o assunto, a criação de um só Imposto sobre Valor
Agregado (IVA) divido em dois tributos (CBS e IBS) com três alíquotas prevê
maior uniformização ao sistema. Com isso, o governo também argumenta que
acabará a cobrança de imposto sobre imposto.
Uma das maiores mudanças é com
relação ao local que recebe a arrecadação: hoje, a arrecadação é na origem. A
reforma prevê que a arrecadação fique no Estado ou cidade de destino (ou seja,
onde serviço ou bem for consumido) e não na origem.
A votação na Câmara já significa
que a reforma foi aprovada?
Não. Como é uma Proposta de
Emenda à Constituição, o texto precisa ser votado em dois turnos na Câmara,
aprovado por três quintos dos deputados (308 votos), e depois ir para análise
do Senado, o que só deve acontecer após a volta do recesso parlamentar.
No Senado, o procedimento é o
mesmo: duas votações com três quintos dos votos a favor. Se os senadores
fizerem alterações significativas no texto, a proposta precisa passar mais uma
vez pela análise da Câmara dos Deputados.
Uma vez aprovada, a reforma passa
a valer imediatamente?
Não, haverá uma fase de
transição. O novo modelo pode estar plenamente implementado, para todos os
tributos, só em 2033.
Durante a campanha eleitoral,
Lula prometeu que pobres pagariam menos impostos e ricos pagariam mais. Isso
está acontecendo nesta reforma?
A primeira fase da reforma
tributária é focada nos tributos que incidem sobre o consumo.
Depois de promulgada a PEC, o
governo terá um prazo de 180 dias para enviar a proposta de alteração nos
impostos sobre a renda. O segundo momento, da discussão sobre tributação que
recai sobre a renda, é apontado por especialistas como a fase em que haverá
margem para taxar mais os mais ricos, com discussão, por exemplo, sobre
tributação de dividendos.
Na campanha, o então candidato
Lula prometeu também isenção de Imposto de Renda para quem ganha até 5 salários
mínimos.
Um dos argumentos para aprovar a
reforma é o de que a simplificação tributária tornará o País mais competitivo.
Que efeito isso pode ter na vida do brasileiro?
Com um sistema mais simples, é
possível identificar o quanto de tributo foi pago pelos brasileiros e melhorar
a eficiência da economia. As empresas poderão deixar de investir milhões de
reais para entender o sistema tributário do País para alocar recursos em
investimentos produtivos, considerados fundamentais para acelerar o crescimento
da economia brasileira.
Em média, o setor produtivo
brasileiro gasta 62 dias ao ano para lidar com as burocracias ligadas ao
pagamento de impostos. Já a média nos países da OCDE é de 6 dias.
O governo estima que a reforma
tributária pode gerar um aumento de 12 a 20 pontos porcentuais no PIB em um
horizonte de 10 a 15 anos.
Mais de 60 economistas e
empresários assinaram um manifesto em apoio à reforma tributária. No documento,
o grupo afirma que a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que reforma os
tributos sobre o consumo seria “abrangente e em conformidade com as melhores
práticas internacionais”.
Por que governadores e prefeitos
debatem com o Congresso alterações no texto?
A reforma encontra resistência em
parte dos prefeitos e governadores porque eles temem perda de arrecadação e
dizem que há uma quebra do pacto federativo. Hoje, os municípios são
responsáveis pela arrecadação do ISS, e os Estados pelo ICMS.
No texto original da PEC, está
prevista a criação de um Conselho Federativo, que seria responsável por
centralizar, gerir e distribuir entre os Estados e os municípios a arrecadação
do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) – que, com a reforma, vai substituir o ICMS
(estadual) e o ISS (municipal).
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) é um dos principais críticos do Conselho. Ele defende uma espécie de câmara de compensação, em que os Estados compensariam uns aos outros ao fim de cada dia por operações interestaduais.
Haddad diz mirar ampla margem na aprovação da reforma tributária -Joadson Alves/Agência Brasil |
O ministro Fernando Haddad (Fazenda) afirmou nesta quarta-feira (5) que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) mira aprovar a reforma tributária com “ampla margem” na Câmara dos Deputados.
O objetivo, segundo o titular da
pasta econômica, é dar um recado de que esse é um “projeto de país”.
“Nossa atuação tem sido técnica,
na condição de dar ao relator [Aguinaldo Ribeiro (PP-PB)] as melhores condições
e incorporar eventuais mudanças no texto para que seja aprovado com ampla
margem”, afirmou.
“Não estamos aqui mirando número
de votos para aprovar. Queremos superar o número mínimo para passar a ideia,
tanto quanto aconteceu com o marco fiscal, que é um projeto de país que está em
curso”, acrescentou.
Por se tratar de uma PEC
(proposta de emenda à Constituição), a matéria precisa do voto favorável de 308
deputados em dois turnos no plenário da Câmara dos Deputados para ser aprovada
e seguir para o Senado.
As declarações foram dadas pelo
ministro ao lado do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas
(Republicanos), após reunião na sede do Ministério da Fazenda, em Brasília.
Tarcísio vinha defendendo a
necessidade de revisão do texto da reforma tributária, sobretudo no que diz
respeito à criação de um conselho federativo, com gestão compartilhada por
estados, Distrito Federal e municípios, que centralizaria a arrecadação do novo
IBS (Imposto sobre Bens e Serviços).
Segundo Haddad, o governador fez
várias ponderações sobre o texto durante o encontro, embora tenha manifestado
apoio à reforma.
“Primeiro manifestou apoio à
reforma, como sempre fez, mesmo sabendo que São Paulo terá um desafio de curto
prazo, sobretudo, e que está disposto a enfrentar, colocando os interesses
nacionais acima de questões regionais e partidárias”, disse.
“[O governador de São Paulo]
trouxe à nossa consideração alguns pontos que já são de conhecimento público
para nossa ponderação”, acrescentou.
(NATHALIA GARCIA – FOLHAPRESS)
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